19.9.06

It’s Just Elegant! (ou “Sofrendo com Legenda”)

Muitos me perguntam sobre o porquê de eu não escrever sobre Torino, ou postar fotos dos lugares e dos acontecimentos daqui. Ao contrário do que podem pensar os negativistas e os niilistas, sim, eu vivo aqui e estou muito bem: Obrigado!, mas creio que parte da minha inércia literária (se é que posso chamar assim) se deve ao fato de eu ter me surpreendido com a drástica constatação de que a vida sadia que eu levara até agora pareceu-me um modo moralmente louco de viver – e sucedeu que aqui eu tenho perenes borboletas no estômago porque agora é a liberdade que me faz carinho. Hoje sofro com legenda por não ter provocado tal maravilha na minha vida tempos antes, já que exalamos felicidade por cada um dos milhares de poros espalhados pelo corpo – disfarçada de feromônios [e insistimos em usar perfume!]. Explico: é que na concepção Aristotélica de felicidade eu estaria convivendo com doses ascentendes e ininterruptas dela, o que faria de mim um potencial Foie Gras ambulante, cuja felicidade seria maior do que meu – agora – burguês fígado consegue digerir. Além do mais, como diria Marilyn Monroe em Seven Years Itch: "It’s just elegant" estar não na Europa [lembram-se do ditado que diz que pode-se levar o asno até a fonte, mas que da água ele somente bebe se quiser?], mas diante de cultura em níveis burlesco – mais, pelo menos, do que eu consigo digerir! Isto é felicidade pra mim sim; tanto quanto descobrir que eu sou um discriminador em plena atividade, mas do tipo que reconhece que tentar mudar os outros – mesmo que dotado das melhores das intenções, também é ser preconceituoso. Sim, extremamente feliz porque, como quem trata de um câncer, eu tenho a possibilidade de cortar o mal pela raiz.

Entre uma crise existencial e outra eu visitei muitas praças, monumentos, relíquias – não garanto, entretanto, que absorvi metade das coisas que vi nestes lugares ainda [na verdade eu ainda não consegui conceber que eu estou na Europa! – tamanha é a minha felicidade por estar aqui...], além do fato de lutar para aprender Italiano. O problema de estar aqui é o fato de que não basta ver, mas também há de se sentir as coisas, saber o que está por trás delas, entender o impacto das mesmas numa civilização centenas de anos mais tudo ou menos tudo – depende do ponto de vista – que se pode imaginar. E acrescento que o próprio estilo de vida das pessoas daqui me fascina: it’s just elegant!; o transporte público me fascina – não tanto como as maneiras de burlar o pagamento dos bilhetes: it’s just elegant!; os orgulhosos e calmos cachorros praticamente zen-budistas que levam seus donos pelas alças das suas disfarçadas coleiras [mal percebem seus donos que eles são os bichos de estimação]: they’re just elegant!; as lindas negras orgulhosas de sua raça e beleza que ostentam o seu estilo pelas ruas de Torino nos seus penteados que conservam suas raízes raciais [sem fazer aquele alisamentos fedorentos e ressentidos]: they’re just elegant!; a babel na Porta Palazzo: it’s just elegant! e principalmente o véu bege de cetim que se tem diante dos olhos que torna blazê todas as cores [talvez já cansadas de ser] da Itália. Os eucalíptos-canadenses também são um show à parte, porque they’re just elegant, e, além de perfume, dão forma pitoresca [e elegant] ao lugar, e que também são responsáveis por eu perceber [elegantly], todo dia de manhã, através do olfato [elegant também graças à vacina antigripal que tomei ainda no Brasil], que eu estou não na Europa, mas numa linha imaginária que não mais é a do Equador, onde eu acostumei me situar, mas algo do tamanho da minha imaginação... [elegant?] Adquiri, aqui, um passatempo, que se tornou um dos mais divertidos dos que eu tenho memória: adoro contemplar as construções e observar as colunas, analizando e rotulando-as [que irônico] como jônicas, dóricas ou coríntias – na verdade não é mais um simples passatempo, tornou-se uma compulsão neurótica, como as que eu normal e naturalmente coleciono. Compulsão como a de, por exemplo, ouvir o som das rodas da mala de viagem sobre as diferentes superfícies das calçadas das cidades, no Brasil. Itália, Itália! O próprio som do nome deste país me faz pensar que estou pisando sobre o mapa da escola secundária, nas tediosas aulas de geografia! Estou num paraíso de história, e que me faz, de certa forma, temer o inferno...

Mas a Itália se torna física quando vejo que estou ao lado do Estádio Olímpico onde aconteceram as Olimpíadas de Inverno, ou que Torino é o lar do Juventus – o time de futebol, cujos jogos acontecem do lado de casa e que são responsáveis por não existir lugar para se estacionar perto de casa. Ah, o trânsito de Torino! O trânsito é uma piada à parte, mas nem um pouco elegant: como é louco o trânsito em Torino, com seus carros estacionados nas esquinas, ou sobre as faixas dos pedestres, ou em fila dupla nas ruas de sentido único. O mesmo trânsito em que os carros não obedecem aos sinais – nem os vermelhos.. quem dirá o verde!? Digo que quem dirige em Torino dirige vendado em qualquer grande-centro do Brasil... Ah, as autoridades não estão nem ai... Olha onde e como o carro foi estacionado!

A língua é outra coisa extremamente curiosa e nervosa! Por mais drástico ou engraçado que pareça, tenho a impressão de que, tentando falar Italiano, aprendi a falar Espanhol! Parece que, no fim das contas, o Espanhol seria um resultado da mistura do Italiano e do Português... Tem um mês que eu estou aqui e digo, sem falsa-modéstia, que compreendo tudo o que se fala comigo, mas a minha língua ainda se recusa a falar Italiano! Fica parecendo que se tem uma surpresa muito grande muito bem preparada e escondida – mas que está guardada à sete chaves e que somente revelar-se-á no momento certo.
A Itália se torna palpável quando eu apresento fotos de mim na Praça Statuto,

diante do meu monumento favorito, ou da Igreja Madre del Dio [que tem colunas coríntias!] e da torre no monte del Capuccini – tudo pertinho do rio Po.

Eu cercado por ruínas romanas milenares

e de um teatro,

de todos os lados em frente ao Museu de Antigüidades e da Igreja Central de Torino, que conserva no seu interior o Santo Sudário (sim, eu estive lá!).

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