14.1.08

Análise Filosófica do “Belo”

Foi mais ou menos assim: eu dei conta do dia, rolando na cama. E entre criar coragem pra levantar e não pensar nas coisas erradas (das quais eu me envergonho, e que me assombram antes de levantar), eu me apeguei à lembrança do Idigar e na Sônia – colegas de trabalho na Escola Técnica, há uns anos atrás. Talvez porque eu quase atendera ao telefone, na Clarks, uns dias atrás saudando “escola técnica, bom dia” e cantar “Lady Laura” muito freqüentemente desde a noticia que a Fernanda Maria dera à luz a sua primeira filha com o Diogo, eu me encontrei lembrando de uma ocasião em que eu estava possuído por uma euforia ligada à música brega. (Eu adorava gravar Cds temáticos) Parece que, ao menos, na época, tudo tinha começado com a Fernanda Maria e a capacidade que ela tinha de encaixar “Lady Laura”, na faculdade, como tema de quase tudo que nos acontecia: eis, então, (simples assim) que eu precisava fazer um CD só com músicas bregas. Era pra ser a minha, então, mais recente fixação – dentre tantas que vêm e vão, pra preencher meus fúteis e vazios dias. Era um dia comum de trabalho, uma das tardes intermináveis em que não era mais a correria da manhã ou a superlotação das aulas noturnas, em que o sol escaldava, o ar-condicionado da minha sala nunca funcionada e por isso eu fazia a pesquisa das faixas no meu computador, do trabalho mesmo (sim, eu sei que isso não pega bem, mas é a verdade...), e eis que chegam o Idigar e a Sônia (o Idigar era o administrador financeiro, a Sônia, secretária escolar e eu o diretor pedagógico) – ambos aparentemente sem nada pra fazer também, e, não sei como, estávamos os três compondo a lista das músicas que deveriam fazer parte do futuro CD. (Nota: por que eu amo fazer listas? O que as listas têm a ver com minha personalidade anal?)

A lista era “glamourosa” – se é que se pode usar essa palavra pra esse tipo de empreendimento; mas que fora selecionada a seis muito graves e cuidadosas mãos. O único problema era que o Idigar não concordava com o fato de eu querer incluir “Lady Laura” no CD. Eu tinha meus vinte e poucos anos, e o Idigar estava na casa dos 40. Eu sempre ouvira dizer que a diferença de idade conta muito nos primeiros anos de vida, como, por exemplo, entre pessoas de 8 e 15 anos, mas que perto dos 30 as diferenças iam-se, completamente. Sim, isso era verdade. Eu posso comprovar a teoria por dizer que as opiniões eram respeitadas, mas mesmo a diferença de idade não sendo mais motivo para tabus e rejeições, história de vida e experiências pessoais não podem ser recicladas. Segundo ele, Roberto Carlos era clássico, e não podia ser interpretado como brega. Eu sabia, de cara, que estava diante da discussão filosófica do belo, e que não adiantava argumentar. Foi, pois, que a solução mais politicamente correta foi fazer duas versões do CD (uma delas secreta – a minha, que continha uma faixa bônus).

Quando eu me levantei – lá pelas onze e tanto, a Lu começava a se arrumar para ir ao trabalho (eu estava folgando hoje), eu decidi me olhar no espelho e encarar os restos de pizza fria da geladeira. Eu ainda pensava em “Lady Laura” e nas influências musicais as quais a filhinha da Fernanda vai ser exposta, quando a Lu pediu pra ouvir “Say You’ll Be There”. Na semana que vem eu e a Lu vamos ao show das Spice Girls, em Londres – banda que, hoje em dia, divide a opinião não só dos ingleses com quem eu trabalho. Todos concordam com o fato de que eles cresceram ouvindo às Spice, mas que hoje em dia era brega continuar ouvindo. Eu, particularmente, discordo do fato de que elas são bregas e vou ao show sim, com direito a comprar tour book e camiseta, na porta (belo filosófico outra vez). Pois bem... uma faixa puxou a outra e eis que ouvindo “Let Love Lead The Way” a Lu estava prestes a soltar uma das suas preciosas pérolas: “essa música é tão magoada”, ela começou. Eu disse que gostava, mas fui interrompido quando ela acrescentou que a Victoria estava igualzinha ao Glayson no vídeo. (Sim, Glayson... parece sim!) E deu saudades do Izalty, que não falava conosco há meses, e a quem dávamos por perdido, talvez consumido por uma raiva desconhecida de nós dois.

Fazia meses que não nos víamos. Depois de ele ter muito carinhosamente nos recebido na sua casa até que eu e a Lu estivéssemos em condição de vivermos por nossa conta, ele sumiu. Foi uma época áurea pra mim, viver com meu amigo: os dias com o Izalty tinham gosto de sábado – mesmo quando chegamos ao ponto em que mudar não era uma opção, mas uma necessidade, caso quiséssemos manter a amizade. Era muito calor humano para pouco espaço físico dividido por meses e meses, eu sei. Eram longos os dias em que passávamos os três, sob o mesmo teto, ouvindo “Ain’t Another Man” ou “Upgrade” naquela casa sonora. E eis que eu e a Lu nos encontramos numa situação em que somente nos encontrávamos ocasionalmente com o Izalty, desde que havíamos deixado sua casa na Watlington Street. Cada telefonema não atendido, mensagem não respondida, convite declinado, ou mesmo as possíveis interpretações do tom da sua voz nas raras mensagens que ele nos enviava – quando enviava, era um motivo pra alimentar a nossa já certeza de que ele não nos queria por perto. E os meses se passaram sem sequer nos dizer onde ele agora morava... já tínhamos aprendido a conviver com of fato de que ele não nos queria por perto, quando, hoje, depois de ficarmos com dor na barriga de tanto rir do Glayson-Victoria que a enxurrada Spice Girls trouxe à tona, que resolvemos ligar pra ele, pensando em deixar mais uma mensagem na sua caixa-postal. Sim, chegamos a um ponto em que eu e a Lu nos contentávamos em apenas enviar as mensagens, sem sequer pensar que elas poderiam ser respondias. A nossa amizade agora era com a secretaria eletrônica...

Mas o inesperado aconteceu: ele atendeu ao telefone. Contamos a história e a epifania que era ver não o Glayson como Victoria, mas com a Victoria como Glayson, e ele riu conosco, como ele sempre ria. O Izalty é uma pessoa de riso natural, que, se o clima e o ambiente eram favoráveis, ele ria até do mais plano e vazio comentário. Mas o riso era diferente... era familiar. E aconteceu o inusitado: ele nos convidou para a sua casa. Ele nos disse onde morava, até... e eu fui. Vesti-me, me perfumei e comprei uma roseira chá, pra a casa onde ele mora com o Guto e a Vanessa. Era solene entrar naquela casa... Levou um tempinho pra eu reconhecer os meus amigos e me soltar. Mas quando me soltei, eu passei uma tarde deliciosa constatando que as coisas não mudam: ambições, Madonna, Tânia viajando, Strada, baco, arroz com feijão, vídeo-game, odiar o cabelo e outras análises filosóficas do belo e do nosso próprio caráter. Eu não quis perguntar a ele se havia mesmo algum motivo pra acreditarmos que havia um clima ruim rondando a nossa amizade, e se era apenas superexposição ou mais uma viagem neurótica minha, em que a Lu entrou de carona... talvez eu pergunte um dia, talvez ele leia esse post e venha falar comigo a respeito (ou não): não sei o que vai acontecer de agora pra frente: se vamos nos ver ocasionalmente, se a vida vai mudar por causa disso... eu já estou mais sorridente e espalhei pra todos os espectadores da minha vida na Inglaterra, que eu fui à casa do Izalty hoje. Até um post acabou virando, ao som de Roberto Carlos, claro. E eu acho lindo! Tudo isso.

Ar de Escritor Decadente (100º Post!!!!)

Seria uma forma interessante de comemorar o meu centésimo post podendo dizer que eu tenho um ar de escritor decadente... mas eu não acho que eu tenha essa cara não. Queria ter. Queria ser mais boêmio, desleixado, infame, desonesto – só pra escrever desnudo de preconceitos. É uma pena não sê-lo – e eu culpo ao Sr. José Cardoso e à dona Maria Custódia por terem me criado num lar sadio e cheio de outras muitas virtudes. (o que são virtudes, afinal?)
Pois bem, eu queria ganhar a vida escrevendo. Talvez, assim, eu teria esse ar de escritor decadente quando estivesse em minhas entressafras de inspiração, em que, entre um cigarro e outro (eu não fumo!!!), eu sentaria numa beira de calçada qualquer, observaria as pessoas e começaria a escrever sobre nenhuma delas, mas sobre todas ao mesmo tempo. Seria uma escrita quântica, algo que representasse a teoria das cordas, mas em português simples pra emoções complexas e sem muita ação.
Eu seria um homem feliz, creio eu, se eu ganhasse a vida escrevendo. Acontece que os depressivos são felizes quando têm motivos pra chorar – e por isso eu não escrevo pra ganhar a vida – ou talvez não tenha mesmo é talento. (De vez em quando eu me divirto me analisando, caindo nas armadilhas do meu inconsciente – às vezes indo pelo caminho correto, outras apenas me distraindo)
Mas, enfim, cheguei ao centésimo post!
Cheers!
...juro que pensei que meu interesse não passaria do quinto!

9.1.08

O Indizível

Tem coisas que são melhores não serem ditas, já dizia a Annie Lenox. E sim, parece que eu censuro até a mim mesmo. Por que eu não quero tocar em alguns assuntos? Medo de que eu tenho? Será medo o sentimento? Acho que eu apenas quero proteger aos meus pais. Parece que, evitando dizer certas coisas, eu os protejo... Mas e o que eu vou proteger depois que meus pais se forem? Sim, estou falando de morte. A morte me ronda aqui, e sei que ela existe para fazer com que se aprecie mais a vida. Mas comigo não funciona porque eu sei que quando choro a morte de alguém, ou evito-a, estou fazendo-o num gesto puramente egoísta – e eu admito isso sim! Quando eu choro a morte de alguém, eu choro por nenhuma outra razão senão a pena que eu tenho de mim mesmo ao me projetar sem a presença daquela pessoa ao meu lado. E se a morte é a ausência, eu não tenho mais medo porque ninguém (família, amigos, colegas, conhecidos) está perto de mim.
E por falar em morte, eu me envergonho de não ter comparecido ao funeral da minha tia Verinha. Se por um lado eu quis manter uma imagem fresca e alegre da minha tia, por outro eu odeio minha negligência para com meu tio e meus primos – que eu amo igualmente. Sonho muito com minha tia. Sonho sempre que eu volto no tempo e que eu tenho algum plano, algum estratagema para livrá-la da morte. Mas ela não me ouve porque eu sou uma criança que ousou dizer o indizível. Não a vi definhar em vida, mas vejo-a sofrendo toda vez em que eu sonho com ela. Quando sonho com minha tia, não é a mesma dor de arrependimento por ter dito ou feito algo do que me arrependo, mas é uma dor infinitamente pior. Minha tia e o Jacko estão sempre juntos, e ao contrário dos outros entes que se foram, parece que eu só percebi a morte dos dois. Parece que funciona assim: já que estou aqui tão longe de todos, engano-me com o suave torpor (ou demência?) de que ainda estão todos vivos, porque, estando tão longe, na faz diferença.

Uma Nova Promessa

Hoje é noite de natal.
Dia 25 de dezembro de 2007.

Ainda são 21h59 e já estávamos todos dormindo. Eu, principalmente, estou reflexivo. Sim, não sou o único a refletir nessa época do ano. Ontem a noite foi super simpática com troca de presentes e um jantar num lugar divertidíssimo chamado NEW ORLEANS. Não chegamos a falar de 2008, mas é inevitável deixar de pensar como vai ser o ano seguinte, já que estamos tão perto.

Mas ao mesmo tempo eu olho para duas fotos por sobre a cômoda e divertido percebo que ambas foram feitas nos dois últimos reveilons: uma em Guarapari, com a família reunida – todos de branco, e a segunda comigo e com a Lu, apenas, em Turin, vestidos pesadamente de preto. Eu ia dizer que não sabia exatamente onde passaria o reveilon de 2007/2008, mas que certamente seria na Inglaterra, e percebi que não há certeza de nada: tudo não passa de promessas.

Incrivelmente eu percebo, agora que a vida é apenas uma grande promessa. Alguns chamam de esperança – que eu, particularmente, odeio e já falei a respeito dessa praga. Mas é diferente a esperança da promessa, eu sei. E me choca perceber que tudo na minha vida foi uma seqüência incoerente de promessas.

A Clarice disse que ela era uma pergunta. Eu sou uma promessa. E por falar em Clarice, e por falar em ano novo ao mesmo tempo, acho que vale a pena citá-la:

“Quando uma pessoa já experimentou muitos sofrimentos, sabe apreciar as fraquezas e as boas qualidades até mesmo dos próprios inimigos. Por que deve ser nosso inimigo completamente mau, ou a vítima completamente boa? Ambos são criaturas humanas, com o que é bom e o que é mau. E creio que se apelarmos para o lado bom das pessoas teremos êxito, na maioria dos casos.
Sei o que ela quis dizer, mas está errado. Há uma hora em que se deve esquecer a própria compreensão humana e tomar um partido, mesmo errado, pela vítima, e um partido, mesmo errado, contra o inimigo. E tornar-se primário a ponto de dividir as pessoas em boas e más. A hora da sobrevivência é aquela em que a crueldade de quem é vítima é permitida, a crueldade e a revolta. E não compreender os outros é que é certo.”

Deu no jornal: em janeiro vai fazer -17 graus!!!

Mas já faz frio agora.
É, não é tão incomum, mas vale a pena mencionar – nem que seja pra que o final faça sentido e se conecte. Mas, enfim, ontem foi reveillon. Foi a primeira vez que eu passei na Inglaterra, então eu, Lu e João fomos parar em Londres, na Parliament Square – onde as coisas acontecem. Parece que é uma festança anual que lá acontece – com direito a celebridades e contagem regressiva, televisionadas para todo o Reino Unido. E, claro, as pessoas mais importantes da noite estavam lá: nós três.
Com direito a bateria da câmera do João acabar, a memória da da Lu encher e só sobrar o meu telefonezinho cafajeste, a noite se revelou um presente. Além do direito a comemorar 3 viradas (Inglaterra, Itália e Brasil), o clima era somente festa, sem nenhum incidente inconveniente – apenas das centenas de milhares de pessoas que dividiam o espaço conosco. Foi delicioso conversar com família, com amigos e descobrir uma brasileira do nosso lado quando falávamos ao telefone, sermos abordados por um polonês bêbado – mas super gente-fina que falava umas palavrinhas em português, os indianos bêbados, as inglesas barulhentas e claro, os diversos papagaios-de-pirata e penetras que adentravam em várias fotos que tentávamos fazer. Foi simples. Inesquecível. Choveu um pouco, mas não o suficiente para desabrilhantar a festa que zerava o pseudo-tempo que vai se chamaria 2008, desde então. Essa delicia me fez pensar que não se deve subestimar as coisas. E entre elas, nem um país em que conversa sobre “tempo” não significa falta de assunto.
Seguem fotos.