26.2.09

Doppelgänger



Hoje eu completei 30 anos. Apesar de não me importar com números, 30 anos é motivo sim pra reflexão. Eu não sabia sobre o que refletir ou comemorar, no entanto – até que eu abri a geladeira e abri um pacote de presunto próximo do prazo de validade: foi quando eu entendi o que o tempo faz com as coisas... e foi, também, quando eu tive a idéia de fazer uma foto do exato momento em que eu faria meus trinta anos, e comemorá-la. Eu também queria me datar!

Quando eu tive a idéia de ver como era completar 30 anos, eu percebi que sem o auxílio de um espelho ou de uma câmera fotográfica, o trabalho não seria possível. E fica a questão: somos escravos da aparência porque não sabemos outra forma de enxergar as coisas? E se não sabemos outra forma de analisar sãs coisas senão por observá-las, para quem a gente se preocupa em parecer bem?

Eu voltei para a cozinha e abri a geladeira procurando pelo rótulo do presunto. Seria correto dizer que a minha busca espiritual se concentra no conteúdo da minha geladeira? Sim, estava pra vencer, mas parecia – e estava delicioso. Quem se lembra de que presunto é um corpo em pausado estado de decomposição, enquanto sente o gosto delicioso da carne entre os dentes? E tem mais, se o pacote fosse pro freezer, duraria ainda mais tempo! E tinha também, um único iogurte na geladeira... o rótulo dizia que ele estava OK, mas eu não queria iogurte naquele momento. Putz! Trinta anos! E eu não tenho comida de criança na geladeira: sou um adulto! Ou o meu iogurte entrega a minha síndrome de Peter-Pan?

Talvez, crescer seja se preocupar com imagem, com o que pensam da gente – ou, em outros termos, preocupar-se em escrever o nosso rótulo! Talvez seja uma espécie de medo que nos faz amadurecer... medo do desconhecido, e resignação ao sentimento de que dependeremos uns dos outros, totalmente, e durante a vida inteira. Meu Deus! Só agora me dei conta do susto que levamos ao perceber que somos seres solitários. É tal susto que fingimos sermos, essencialmente, seres sociais... (Rótulo bem construído é marketing social!)

Um simples susto, um choquezinho faz com que nos tornemos adultos... E não precisa ser muita coisa, eu acho: depende de cada um. E se se pensar bem, todos sabem exatamente o momento em que se tornaram adultos. E enganam-se os que dizem que tornar-se adulto é perder a inocência! Deixar de ser criança não é perder inocência – ou a validade... A inocência está em cada coisa que a gente não conhece. A gente é inocente ou virgem de tudo o que não experimentamos. Mas, voltando ao tópico da geladeira: adulto não tem doce na geladeira porque faz dieta e faz dieta porque se preocupa com imagem. E se preocupa com imagem porque se preocupa com o que os outros pensam dele, e tudo, mais uma vez, se resume ao rótulo! A gente se preocupa com o que o nosso rótulo diz a respeito de nós.

E em busca do perfeito rótulo, criamos duas versões do self: uma pra nós mesmos, e outra pro que está em volta da gente: afinal, alguém tem que ler o rótulo que estamos desenvolvendo! Ainda penso em como é cômodo me contrariar pra evitar discussões desgastantes – como, por exemplo, quando eu desejava que o Deus abençoasse meu chefe, ou quando eu respondo que eu não tenho namorada. Há momentos em que, pro nosso self, a gente se aceita, mas é mais fácil manter essas crenças apenas para o nosso self... Então porque a gente se aceita, mas não se aceita de verdade? E o que o meu Doppelgänger teria a me dizer agora? Como ele reagiria quando eu lhe oferecesse as boas-vindas ao início da sua quarta década de vida! (eu fiquei assombrado quando percebi!)

P.S.: Mas eu insisto: o problema com os rótulos é que temos controle do que é escrito nele, mas não sobre como ele será decodificado.

18.2.09

Agressividade Passiva

Quando eu prendo a respiração eu sinto o tempo (ou o mundo) acontecendo através do meu corpo latejando, minha cabeça rodando e o contato com as coisas. É quando eu me sinto vivo. É quando eu percebo que há algo muito além de mim. Daí eu durmo pra ter menos contato com a realidade, mas os sonhos continuam a me mostrar o obvio quando eu fecho os meus olhos. O consolo é o fato de que eu tenho o controle sobre a minha existência: basta um “não” e tudo cessa – ao menos dessa vez.

História sem fim...



Eu me preparei por anos pra o reencontro, e achei que estava pronto até que eu entrei em pânico minutos antes de encontrá-lo. Num dado momento eu pensei que palavras poderiam fechar – finalmente, a ferida. Mas o fato de eu ter sido cortado das fotos me incomoda.
Acabei de escrever um mail perguntando.
Agora que eu perguntei me sinto mais aliviado... pelo menos quanto aos cortes, mas o que incomodará em seguida nessa história sem fim?

10.2.09

Intelectualóide

Antes eu dormia com as mãos atrás da cabeça: hoje eu durmo em posição fetal.

Bem no fundo, eu tinha medo de ser um intelectualóide, então eu fugi. Não sei se hoje em dia eu me puno com uma vida medíocre pra me lembrar do que eu tenho medo: eu escrevo no escuro...

Eu estou trocando, aos poucos, minhas fobias, por um novo pavor.