Foi mais ou menos assim: eu dei conta do dia, rolando na cama. E entre criar coragem pra levantar e não pensar nas coisas erradas (das quais eu me envergonho, e que me assombram antes de levantar), eu me apeguei à lembrança do Idigar e na Sônia – colegas de trabalho na Escola Técnica, há uns anos atrás. Talvez porque eu quase atendera ao telefone, na Clarks, uns dias atrás saudando “escola técnica, bom dia” e cantar “Lady Laura” muito freqüentemente desde a noticia que a Fernanda Maria dera à luz a sua primeira filha com o Diogo, eu me encontrei lembrando de uma ocasião em que eu estava possuído por uma euforia ligada à música brega. (Eu adorava gravar Cds temáticos) Parece que, ao menos, na época, tudo tinha começado com a Fernanda Maria e a capacidade que ela tinha de encaixar “Lady Laura”, na faculdade, como tema de quase tudo que nos acontecia: eis, então, (simples assim) que eu precisava fazer um CD só com músicas bregas. Era pra ser a minha, então, mais recente fixação – dentre tantas que vêm e vão, pra preencher meus fúteis e vazios dias. Era um dia comum de trabalho, uma das tardes intermináveis em que não era mais a correria da manhã ou a superlotação das aulas noturnas, em que o sol escaldava, o ar-condicionado da minha sala nunca funcionada e por isso eu fazia a pesquisa das faixas no meu computador, do trabalho mesmo (sim, eu sei que isso não pega bem, mas é a verdade...), e eis que chegam o Idigar e a Sônia (o Idigar era o administrador financeiro, a Sônia, secretária escolar e eu o diretor pedagógico) – ambos aparentemente sem nada pra fazer também, e, não sei como, estávamos os três compondo a lista das músicas que deveriam fazer parte do futuro CD. (Nota: por que eu amo fazer listas? O que as listas têm a ver com minha personalidade anal?)
A lista era “glamourosa” – se é que se pode usar essa palavra pra esse tipo de empreendimento; mas que fora selecionada a seis muito graves e cuidadosas mãos. O único problema era que o Idigar não concordava com o fato de eu querer incluir “Lady Laura” no CD. Eu tinha meus vinte e poucos anos, e o Idigar estava na casa dos 40. Eu sempre ouvira dizer que a diferença de idade conta muito nos primeiros anos de vida, como, por exemplo, entre pessoas de 8 e 15 anos, mas que perto dos 30 as diferenças iam-se, completamente. Sim, isso era verdade. Eu posso comprovar a teoria por dizer que as opiniões eram respeitadas, mas mesmo a diferença de idade não sendo mais motivo para tabus e rejeições, história de vida e experiências pessoais não podem ser recicladas. Segundo ele, Roberto Carlos era clássico, e não podia ser interpretado como brega. Eu sabia, de cara, que estava diante da discussão filosófica do belo, e que não adiantava argumentar. Foi, pois, que a solução mais politicamente correta foi fazer duas versões do CD (uma delas secreta – a minha, que continha uma faixa bônus).
Quando eu me levantei – lá pelas onze e tanto, a Lu começava a se arrumar para ir ao trabalho (eu estava folgando hoje), eu decidi me olhar no espelho e encarar os restos de pizza fria da geladeira. Eu ainda pensava em “Lady Laura” e nas influências musicais as quais a filhinha da Fernanda vai ser exposta, quando a Lu pediu pra ouvir “Say You’ll Be There”. Na semana que vem eu e a Lu vamos ao show das Spice Girls, em Londres – banda que, hoje em dia, divide a opinião não só dos ingleses com quem eu trabalho. Todos concordam com o fato de que eles cresceram ouvindo às Spice, mas que hoje em dia era brega continuar ouvindo. Eu, particularmente, discordo do fato de que elas são bregas e vou ao show sim, com direito a comprar tour book e camiseta, na porta (belo filosófico outra vez). Pois bem... uma faixa puxou a outra e eis que ouvindo “Let Love Lead The Way” a Lu estava prestes a soltar uma das suas preciosas pérolas: “essa música é tão magoada”, ela começou. Eu disse que gostava, mas fui interrompido quando ela acrescentou que a Victoria estava igualzinha ao Glayson no vídeo. (Sim, Glayson... parece sim!) E deu saudades do Izalty, que não falava conosco há meses, e a quem dávamos por perdido, talvez consumido por uma raiva desconhecida de nós dois.
Fazia meses que não nos víamos. Depois de ele ter muito carinhosamente nos recebido na sua casa até que eu e a Lu estivéssemos em condição de vivermos por nossa conta, ele sumiu. Foi uma época áurea pra mim, viver com meu amigo: os dias com o Izalty tinham gosto de sábado – mesmo quando chegamos ao ponto em que mudar não era uma opção, mas uma necessidade, caso quiséssemos manter a amizade. Era muito calor humano para pouco espaço físico dividido por meses e meses, eu sei. Eram longos os dias em que passávamos os três, sob o mesmo teto, ouvindo “Ain’t Another Man” ou “Upgrade” naquela casa sonora. E eis que eu e a Lu nos encontramos numa situação em que somente nos encontrávamos ocasionalmente com o Izalty, desde que havíamos deixado sua casa na Watlington Street. Cada telefonema não atendido, mensagem não respondida, convite declinado, ou mesmo as possíveis interpretações do tom da sua voz nas raras mensagens que ele nos enviava – quando enviava, era um motivo pra alimentar a nossa já certeza de que ele não nos queria por perto. E os meses se passaram sem sequer nos dizer onde ele agora morava... já tínhamos aprendido a conviver com of fato de que ele não nos queria por perto, quando, hoje, depois de ficarmos com dor na barriga de tanto rir do Glayson-Victoria que a enxurrada Spice Girls trouxe à tona, que resolvemos ligar pra ele, pensando em deixar mais uma mensagem na sua caixa-postal. Sim, chegamos a um ponto em que eu e a Lu nos contentávamos em apenas enviar as mensagens, sem sequer pensar que elas poderiam ser respondias. A nossa amizade agora era com a secretaria eletrônica...
Mas o inesperado aconteceu: ele atendeu ao telefone. Contamos a história e a epifania que era ver não o Glayson como Victoria, mas com a Victoria como Glayson, e ele riu conosco, como ele sempre ria. O Izalty é uma pessoa de riso natural, que, se o clima e o ambiente eram favoráveis, ele ria até do mais plano e vazio comentário. Mas o riso era diferente... era familiar. E aconteceu o inusitado: ele nos convidou para a sua casa. Ele nos disse onde morava, até... e eu fui. Vesti-me, me perfumei e comprei uma roseira chá, pra a casa onde ele mora com o Guto e a Vanessa. Era solene entrar naquela casa... Levou um tempinho pra eu reconhecer os meus amigos e me soltar. Mas quando me soltei, eu passei uma tarde deliciosa constatando que as coisas não mudam: ambições, Madonna, Tânia viajando, Strada, baco, arroz com feijão, vídeo-game, odiar o cabelo e outras análises filosóficas do belo e do nosso próprio caráter. Eu não quis perguntar a ele se havia mesmo algum motivo pra acreditarmos que havia um clima ruim rondando a nossa amizade, e se era apenas superexposição ou mais uma viagem neurótica minha, em que a Lu entrou de carona... talvez eu pergunte um dia, talvez ele leia esse post e venha falar comigo a respeito (ou não): não sei o que vai acontecer de agora pra frente: se vamos nos ver ocasionalmente, se a vida vai mudar por causa disso... eu já estou mais sorridente e espalhei pra todos os espectadores da minha vida na Inglaterra, que eu fui à casa do Izalty hoje. Até um post acabou virando, ao som de Roberto Carlos, claro. E eu acho lindo! Tudo isso.
A lista era “glamourosa” – se é que se pode usar essa palavra pra esse tipo de empreendimento; mas que fora selecionada a seis muito graves e cuidadosas mãos. O único problema era que o Idigar não concordava com o fato de eu querer incluir “Lady Laura” no CD. Eu tinha meus vinte e poucos anos, e o Idigar estava na casa dos 40. Eu sempre ouvira dizer que a diferença de idade conta muito nos primeiros anos de vida, como, por exemplo, entre pessoas de 8 e 15 anos, mas que perto dos 30 as diferenças iam-se, completamente. Sim, isso era verdade. Eu posso comprovar a teoria por dizer que as opiniões eram respeitadas, mas mesmo a diferença de idade não sendo mais motivo para tabus e rejeições, história de vida e experiências pessoais não podem ser recicladas. Segundo ele, Roberto Carlos era clássico, e não podia ser interpretado como brega. Eu sabia, de cara, que estava diante da discussão filosófica do belo, e que não adiantava argumentar. Foi, pois, que a solução mais politicamente correta foi fazer duas versões do CD (uma delas secreta – a minha, que continha uma faixa bônus).
Quando eu me levantei – lá pelas onze e tanto, a Lu começava a se arrumar para ir ao trabalho (eu estava folgando hoje), eu decidi me olhar no espelho e encarar os restos de pizza fria da geladeira. Eu ainda pensava em “Lady Laura” e nas influências musicais as quais a filhinha da Fernanda vai ser exposta, quando a Lu pediu pra ouvir “Say You’ll Be There”. Na semana que vem eu e a Lu vamos ao show das Spice Girls, em Londres – banda que, hoje em dia, divide a opinião não só dos ingleses com quem eu trabalho. Todos concordam com o fato de que eles cresceram ouvindo às Spice, mas que hoje em dia era brega continuar ouvindo. Eu, particularmente, discordo do fato de que elas são bregas e vou ao show sim, com direito a comprar tour book e camiseta, na porta (belo filosófico outra vez). Pois bem... uma faixa puxou a outra e eis que ouvindo “Let Love Lead The Way” a Lu estava prestes a soltar uma das suas preciosas pérolas: “essa música é tão magoada”, ela começou. Eu disse que gostava, mas fui interrompido quando ela acrescentou que a Victoria estava igualzinha ao Glayson no vídeo. (Sim, Glayson... parece sim!) E deu saudades do Izalty, que não falava conosco há meses, e a quem dávamos por perdido, talvez consumido por uma raiva desconhecida de nós dois.
Fazia meses que não nos víamos. Depois de ele ter muito carinhosamente nos recebido na sua casa até que eu e a Lu estivéssemos em condição de vivermos por nossa conta, ele sumiu. Foi uma época áurea pra mim, viver com meu amigo: os dias com o Izalty tinham gosto de sábado – mesmo quando chegamos ao ponto em que mudar não era uma opção, mas uma necessidade, caso quiséssemos manter a amizade. Era muito calor humano para pouco espaço físico dividido por meses e meses, eu sei. Eram longos os dias em que passávamos os três, sob o mesmo teto, ouvindo “Ain’t Another Man” ou “Upgrade” naquela casa sonora. E eis que eu e a Lu nos encontramos numa situação em que somente nos encontrávamos ocasionalmente com o Izalty, desde que havíamos deixado sua casa na Watlington Street. Cada telefonema não atendido, mensagem não respondida, convite declinado, ou mesmo as possíveis interpretações do tom da sua voz nas raras mensagens que ele nos enviava – quando enviava, era um motivo pra alimentar a nossa já certeza de que ele não nos queria por perto. E os meses se passaram sem sequer nos dizer onde ele agora morava... já tínhamos aprendido a conviver com of fato de que ele não nos queria por perto, quando, hoje, depois de ficarmos com dor na barriga de tanto rir do Glayson-Victoria que a enxurrada Spice Girls trouxe à tona, que resolvemos ligar pra ele, pensando em deixar mais uma mensagem na sua caixa-postal. Sim, chegamos a um ponto em que eu e a Lu nos contentávamos em apenas enviar as mensagens, sem sequer pensar que elas poderiam ser respondias. A nossa amizade agora era com a secretaria eletrônica...
Mas o inesperado aconteceu: ele atendeu ao telefone. Contamos a história e a epifania que era ver não o Glayson como Victoria, mas com a Victoria como Glayson, e ele riu conosco, como ele sempre ria. O Izalty é uma pessoa de riso natural, que, se o clima e o ambiente eram favoráveis, ele ria até do mais plano e vazio comentário. Mas o riso era diferente... era familiar. E aconteceu o inusitado: ele nos convidou para a sua casa. Ele nos disse onde morava, até... e eu fui. Vesti-me, me perfumei e comprei uma roseira chá, pra a casa onde ele mora com o Guto e a Vanessa. Era solene entrar naquela casa... Levou um tempinho pra eu reconhecer os meus amigos e me soltar. Mas quando me soltei, eu passei uma tarde deliciosa constatando que as coisas não mudam: ambições, Madonna, Tânia viajando, Strada, baco, arroz com feijão, vídeo-game, odiar o cabelo e outras análises filosóficas do belo e do nosso próprio caráter. Eu não quis perguntar a ele se havia mesmo algum motivo pra acreditarmos que havia um clima ruim rondando a nossa amizade, e se era apenas superexposição ou mais uma viagem neurótica minha, em que a Lu entrou de carona... talvez eu pergunte um dia, talvez ele leia esse post e venha falar comigo a respeito (ou não): não sei o que vai acontecer de agora pra frente: se vamos nos ver ocasionalmente, se a vida vai mudar por causa disso... eu já estou mais sorridente e espalhei pra todos os espectadores da minha vida na Inglaterra, que eu fui à casa do Izalty hoje. Até um post acabou virando, ao som de Roberto Carlos, claro. E eu acho lindo! Tudo isso.
Um comentário:
Léo, um prazer me enche o peito de ver meus amigos de bem com vida.
Temos muitas recordações e todas boas
Um abraço. Idigar
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